11 de abr. de 2012

Sua ausência fazendo silêncio

Já era praticamente uma regra fazer isso em dias chuvosos: passar em um posto de gasolina, comprar umas garrafas de vinho barato e ir para a casa dele. A pé. Acho que até gostava dos pingos caindo em minha cabeça. Na verdade só não me importava, o frio já fazia parte da minha rotina. Enquanto escutava as garrafas se batendo dentro da sacola, lembrava que ele preferia cerveja. Sempre lembrava disso, mas nunca voltava para buscá-las. Vinho aquecia mais. Gostava da rua vazia, do som dos carros passando e espirrando água nas calcadas. Chegando na frente do prédio, apertava o número 22 e ele abria sem falar nada pelo interfone. A porta sempre estava aberta, e ele sempre sentado no sofá assistindo algum programa ruim na televisão. Às vezes me incomodava o fato de ele nunca levantar para me receber, ou abrir a porta com um abraco. Mas por outro lado me sentia confortável em saber que poderia prever qualquer movimento dele. Lhe dava um beijo, e ia para o chuveiro. Gostava quando ele ficava na porta do banheiro me vendo tomar banho e me perguntando sobre qualquer coisa boba. Gostava daquele olhar bobo. Compensava o fato de nunca ser recepcionada por ele. Saía do banho, vestia um moletom dele e íamos para a sala, carregados de cobertores e travesseiros. Enquanto eu ia até a cozinha buscar o sacarrolhas, ouvia ele comentando sobre o filme que iriamos ver, ou sobre o da semana passada. Seu gosto para filmes era estranhamente bom. Sabia prever os filmes que eu ia gostar, conhecia meus gostos como ninguém mais. Ele entendia muito mais de diretores e de estilos do que eu, mas sempre me agradava. Sentava ao seu lado com o vinho já aberto, e sem copos. O filme comecava, a garrafa revezava entre a minha mao e a dele até acabar e eu buscar a próxima. Assim acontecia até o fim do filme e das garrafas. Já meio embriagados tentávamos fazer algum comentário sobre o filme, mas ele sempre acabava dando risada da maneira meio enrolada como tentava falar. Era tudo tao comum, mas tao irresistível ao mesmo tempo. Sempre que pensava em variar, lembrava de como era bom terminar dando risada de qualquer coisa ao lado dele. Era perfeita sintonia. Ríamos até dar sono, dormíamos conversando e acordávamos satisfeitos. Hoje coleciono todos os filmes que ele me mostrou, guardo algumas rolhas dos vinhos que tomávamos, e sinto seu cheiro nos domingos chuvosos. Seu lugar será pra sempre insubstituível na minha vida, naquele sofá sob as cobertas, na preferencia por cervejas. Ainda consigo o sentir nas noites frias, quando mais sinto sua falta ao meu lado na cama. E o bilhete na cabeceira da minha cama que voce deixou antes de partir. "I will love you always, and forever."

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