16 de jun. de 2009

Lé présent est mort,vive l'avenir

por Drama Queen.

Usava meias brancas dentro de casa. Lógico, não era ele que as lavava. Pra isso existiam as lavanderias do bairro.Cabelos bagunçados e dentes bonitos graças à três anos de aparelho fixo durante a adolescência.Tinha uma namorada, Anna, há quase um ano. Ela tinha cabelos claros e gostava de cinema. Faziam sexo três vezes por semana e moravam há cinco quadras um do outro.Durante o inverno sua roupa preferida era um suéter preto que ganhou de aniversário de uma tia, em 1999. Era sua peça de estimação.Sua escrivaninha era deveras bagunçada, com milhares de papéis espalhados, traduções e recortes de revista. Estava tentando aprender francês sozinho em casa.

Un, deux, trois.

Saiu pra comprar pão e iogurte numa quinta cinzenta e esbarrou no amor da sua vida. Julia.

Ei, cara, não precisa empurrar!

Só conseguiu dar um sorriso bobo e dizer que tinha um farelo grudado no queixo dela. Ela ficou vermelha e mais irritada. Ora, onde já se viu um cara que se encosta todo e nem pra pedir desculpas.

Mas.. desculpa, viu.

Ah, bom. Assim, sim. E ele até era bonitinho. Comprou o pão e olhou mais uma vez, Julia agora estava sentada sozinha numa mesa tomando refrigerante e comendo um mil-folhas enquanto lia um livro.Voltou pra casa pensativo e lá estava Anna, tinha comprado um DVD novo e queria assistir, tinha até arrumado a cama dele.

Daniel, você precisa levar essas meias pra lavanderia.

Ele sabia. E não era só isso. Ele precisava levar a vida toda dele pra lavanderia, jogar uma água e mudar de ares. Anna era linda e inteligente, Anna era um amor pra toda vida. Mas não pra vida dele. Não. E ele havia descoberto isso naquele mesmo dia.

Ahn, já assisti esse filme na faculdade ano passado, vai vendo que eu vou levar essas meias mesmo.

Ela achou que tudo bem, deitou na cama e ficou assistindo. Ele juntou as meias numa sacola, pegou a chave e uma cerveja da geladeira e saiu de casa.Caminhou a quadra toda e entrou na lavanderia, deserta. Estava dando um jeito naquelas meias todas e alguém entra e esse alguém é Julia. Ela olha nervosa.

Você, mais uma vez.

Algumas meias cairam no chão, ele juntou e pensou em algo pra se dizer, não vinha nada na cabeça, o momento parecia estar escapando das mãos então falou qualquer coisa.

Oi, eu sou Dan.

Ela ficou olhando com uma cara de oh- céus-o-que-eu-digo-para-o-senhor-falta-de-criatividade. Segundos depois ela respondeu.

Que cheiro ruim.

Ele riu.

São minhas meias, mas não espalha.

Sua pose de rainha irritada foi pelos ares e teve que dar um sorriso de canto. Assim começou uma longa conversa. Sentados nas cadeiras plásticas da lavanderia, falaram desde meias até Natal em família.Agora ele sabia o nome da menina e sabia que ela gostava das mesmas bandas que ele e que tinha cílios grandes. O que ele achava lindo. E Anna não tinha cílios grandes, apesar de sua beleza ímpar.Voltou pra casa e disse pra sua namorada que precisava dormir, ela foi embora e ficou a noite inteira pensando em Julia.No outro dia apareceu na lavanderia, levou umas camisetas, e lá estava ela. Eles não tinham marcado, mas já sabiam. E sorriram mil vezes e falaram de livros e de infância.À noite, Anna ligou e Dan partiu seu coração. Era necessário. Ele tinha algo a fazer.
Estou interessado em outra pessoa, Anna. Foi bom enquanto durou. Levo teus DVDs na terça.

E Anna entendeu, era centrada. Sofreu um pouco e engoliu o choro. Era uma mulher de cabeça erguida.E ele foi até a lavanderia, foi procurar Julia. Ela não tinha chegado. Esperou mais dez minutos. Estava garoando, ela poderia ter se atrasado. Talvez nem viesse. Ele estava com o suéter preferido na mão. Trouxe pra lavar e pra mostrar à Julia seu troféu.Dezoito minutos depois ela chegou, cabelo meio molhado, blusa amarela. Sorriu. Eles se abraçaram como se fossem velhos conhecidos. Naquela hora ele viu que não se arrependeria de ter abandonado o que tinha construido até ali.

Tá frio. Eu te trouxe um livro hoje. Vamos sair pra comer um doce?

A voz baixinha e rouca dela era música pros seus ouvidos. Ela o puxou pelas mãos e seus corpos tremeram. Aquele seria o dia.Não é a toa que se diz por aí, as pessoas sentem quando vão se apaixonar pra sempre.Correram pra atravessar a rua, daria uma bela fotografia antiga em preto e branco aquela cena. Porém, o carro não freiou no sinal vermelho.Os dois morreram ali, de mãos dadas e antes do seu primeiro beijo. Pararam de respirar antes mesmo de a ambulância chegar.O carro acelerou. Era Anna. Todos sabemos quando coisas importantes vão acontecer. Anna também já sabia.Ela era mais uma dessas mulheres centradas que simplesmente não aceitam perder, que não admitem o fato de que nem todos os finais são felizes.E no bolso de Daniel um último escrito, mostrando que o dia já estava marcado pelo fim.

Je suis l`instigateur du crime, je suis la ruine et la douleur, je suis la honte, je suis le déshonneur, je suis la mort, je suis l`amour.

4 comentários:

' disse...

to um bom tempo sem passa aqui, cada dia seus textos tao melhores guria!
to colocando textos melhores no meu, quando puder dê uma passada por lá, para falar o que achou, gosto de saber o que os outros acham :)

beijao querida :*

' disse...

Oi querida, desculpa a demora!
em relaçao a sua pergunta sobre a Nane, sim , eu conheci ela.
Nós eramos amigas, pelo que li você é prima dela, certo?
Obrigada pelo comentário, e que bom que você gostou dos textos.
Pode ter certeza que não viu parar de escrever haha. Beijão, se cuida.

Sheyla Amaral disse...

Olá, sabe informar o autor do último parágrafo (em francês)? Gratíssima!

Sheyla Amaral disse...

Olá, sabe informar o autor do último parágrafo (em francês)? Gratíssima!


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